sábado, 26 de janeiro de 2013

Policiais Militares desrespeitam e expulsam torcedor durante a final da Copinha


"Compromisso com o cidadão".

Eis o lema escrito, mas não seguido da Polícia Militar do Estado de São Paulo

Afixado no gramado do Estádio do Pacaembu, tais dizeres prometiam respeito aos direitos dos torcedores que compareceram em ótimo número para a final da Copa São Paulo de Futebol Júnior, vencida pelo Santos Futebol Clube, na manhã do último dia 25 de janeiro, aniversário da maior metrópole da América do Sul.

Esse subscritor, por problemas de localização geográfica conseguiu chegar ao Estádio, mais precisamente, no portão '09', apenas no intervalo da partida. Sem ingresso em mãos, avisei meu amigo e torcedor fanático do Santos, o qual encontrava-se no interior da praça desportiva, para que viesse ao meu encontro para entregar a entrada,  adquirida por ele, frise-se, após quatro longas e inadmissíveis horas na fila no dia anterior. 

Com a permissão do fiscal da Federação Paulista de Futebol, para sair do setor onde a Torcida Jovem do Santos vibrantemente empurrava os “meninos da vila”, e rumar até a entrada do setor das numeradas, pelo qual inclusive havia antes adentrado ao estádio, meu amigo, devidamente uniformizado, conseguiu entregar-me o ingresso.

Assim, com a entrada na mão, pude rapidamente acessar o interior das arquibancadas – sem, é claro, ter sofrido qualquer revista rigorosa por parte da Polícia Militar. Inobstante a isso, segundos depois, quando nos dirigíamos ao setor da torcida organizada, dois policiais, entoando vozes ameaçadoras, dirigiram-se aos gritos para o amigo que me acompanhava, informando-lhe que ali não poderia permanecer, pois, por trajar vestimenta da organizada, imaginaram que havia pulado a divisória e estava naquele espaço de modo irregular.

Imediatamente, iniciamos uma argumentação respeitosa aduzindo que ele havia adquirido as numeradas e que, por lapso, havia jogado o ingresso fora após entrar no estádio (costume de muitos), e que comprovaria tal fato chamando o pai que estava a poucos metros. No entanto, esses policiais que prestaram um juramento em suas corporações para honrar o compromisso com o cidadão e, consequente, torcedor paulista, ultimaram irônica e efusivamente, se ele queria sair do estádio por bem, ou se gostaria de ser levado ao posto de comando sob ‘forte escolta’, em outras palavras, com covardia e violência. Nesse particular, um terceiro policial, após ouvir os fatos, afirmou que daria voz de prisão caso ele não saísse da praça de desporto, ao alegar estar sendo desrespeitado, no que comprovava, portanto, a ignorância e a falta de diálogo que frequentemente culmina na prática de abuso de autoridade, utilizada por muitos membros de segurança pública presentes nos estádios. 

Vale lembrar. Isso tudo, gerado pela preguiça em refletirem racionalmente sobre o que estava a acontecer. Ora, quais os motivos de um torcedor, membro de organizada, pular a divisória do Pacaembu, a qual, diga-se de passagem, nos remete as existentes em um presídio, onde se encontram fiscais da Federação e outros Policiais Militares, com um ingresso para o setor das numeradas, na qual o custo de compra era mais elevado, senão para entregar o ingresso no setor que já estava?  Se assim não fosse, e caso ele não tivesse permissão para estar nas numeradas, obviamente eu iria receber o ingresso na entrada do setor principal da Praça Charles Muller e, ato contínuo, seguiria até o portão 09.

Infelizmente, no momento não conseguimos comprovar a anuência do fiscal da federação, visto que como cediço, em descompasso com o Estatuto do Torcedor, inexiste um trabalho integrado entre esses dois órgãos de organização durante as partidas, acarretando em um "gentil convite" para que meu amigo se retirasse do estádio, no que imediatamente a ele me juntei para denunciar referido abuso ao Ouvidor da Competição.

Ao chegar à entrada principal do Paulo Machado de Carvalho, busquei por fiscais da Federação que não souberam direcionar exatamente quem era o Ouvidor da Competição. Apenas, apontaram para que eu conversasse com outro fiscal. Nesse meio tempo, paramos para falar com outros dois policiais militares, um deles do sexo feminino, e, felizmente, de forma calma, pude explicar todo o mal-entendido e o abuso de autoridade exercido momentos antes.

De maneira correta e ponderada, a policial militar entendeu o que havia sucedido e ordenou a um fiscal da federação, que adentrássemos ao estádio mesmo sem mais portar qualquer ingresso. Por fim, reforçou que só estava a permitir a entrada, porque esse que por ora escreve, conversou calmamente, sem alardes e desespero como o meu amigo, exaltado por razões óbvias, haja vista estava a perder o inicio do segundo tempo, assim o fez.

Afirmou ainda, que, em que pese ele tivesse razão, como o tinha, jamais seria ouvido por qualquer policial militar. Primeiro pelo fato de exigir seus direitos de forma um tanto quanto agressiva pelo desespero que o acometia e, sobretudo, pelo estigma negativo que os torcedores de organizadas recebem da maioria dos efetivos de segurança.

Tal experiência, quiçá, veio a calhar para comprovar o que, em posts anteriores e em revistas jusdesportivas, venho defendendo, ainda que sob alvo de críticas. Faz-se urgente e necessário a substituição dos efetivos de segurança pública, por seguranças privados acompanhados de orientadores, os denominados 'stewards'. Os torcedores já não aguentam mais ser tratados como animais, constantemente privados de se manifestarem contra a irresponsável e ditatorial repressão exercida pelos membros da Polícia Militar nos estádios do país. Quem procede de forma semelhante, invariavelmente receberá o mesmo destino experimentando ontem por nós torcedores, ou seja, expulsão ou condução à delegacia sem sequer ter infringido qualquer obrigação.

Com efeito, é inadmissível, em plena evolução da indústria esportiva, aceitar o fato de que tais policiais, nitidamente despreparados, sobretudo, psicologicamente, como os que ontem pude me deparar, estejam à frente de toda a responsabilidade de segurança que envolve uma partida de futebol, quais sejam, prevenção, revistas de segurança e contenção. 

Destarte, precisamos urgentemente lutar contra estigmas que vêm sendo direcionado aos torcedores, principalmente, os de organizadas, fato esse comum no meio da Policia Militar de São Paulo com outra parcela da sociedade, vide - http://www.cartacapital.com.br/sociedade/orientacao-racista-na-pm-sp-provoca-indignacao-de-grupo-de-direitos-humanos/ - e às constantes violações aos direitos dos torcedores.

Notem que apenas, no lamentável episódio ocorrido na manhã de sábado, chegaram a proibir o sagrado direito de o torcedor assistir ao seu time de coração, sem sequer ouvir suas justificativas, violando, por conseguinte, artigos basilares acerca do respeito, educação, orientação e segurança que devem ser assegurados aos adeptos por força do Código De Defesa do Consumidor e do Estatuto Do Torcedor.

Derradeiramente, ressalto que, ainda que os policiais estivessem incorrido em erro, como ocorreu, poderiam tê-lo levado ao setor da organizada do Santos, imaginado por eles como o local de origem do meu amigo e torcedor alvinegro. Mas daí seria pedir muito, até porque mandar torcedores para fora utilizando-se do “poder das algemas” será sempre mais cômodo e eficaz, não é mesmo?

Com indignação,

FELIPE TOBAR

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Neymar, o filósofo e a paz no futebol



O jornal Agora trouxe uma declaração do jogador Neymar, do Santos, que se faz merecedora de atenção, pois toca no importante tema da rivalidade no futebol.

 Talvez, nem ele tenha refletido bem sobre o que disse, mas suas sábias palavras foram as seguintes: “Rivalidade, a brincadeira tem que existir, se não futebol não tem graça, tem que zoar mesmo, é brincadeira. Não tem questão de ficar bravo, futebol é assim, um sacaneando o outro” (15/12/12, p. B11).

 Lendo isso, você, prezado(a) leitor(a), não pensa – assim como eu – que Neymar está corretíssimo em sua afirmação?

 Pois bem, vamos adiante. O filósofo brasileiro Demerval Saviani, da Unicamp, ao prefaciar o livroFutebol e violência, de Heloísa Reis, renomada estudiosa, também da Unicamp, escreve que “o futebol, por essência e por definição, exclui a violência”. E mais: segundo Saviani, “Levar na esportiva significa não cair em provocações, reagir com bom humor. Tem espírito esportivo quem sabe ganhar ou perder com classe, com elegância” (Ed. Armazém do Ipê/Fapesp, 2006, p. XVI).

 Perdoe-me o (a) leitor(a) se insisto em perguntar: Saviani não tem razão ao escrever o que escreveu no prefácio do livro de Heloísa Reis? Seu pensamento, enquanto filósofo profissional, e o de Neymar, estrela do futebol, mas também naturalmente filósofo – como todos somos –, não se unem nesse ponto?

 No entanto, as falas de Neymar e de Saviani parecem ficar muito, mas muito aquém do que algumas vezes ocorre em partidas futebolísticas, no Brasil ou no exterior, uma vez que nelas predomina a rivalidade doentia e menosprezadora do próprio ser humano.

 Com efeito, Aristóteles, falecido em 322 a.C., definiu o homem como um “animal racional”, ou seja, à diferença dos outros animais, ele conta com a razão. Esta deve, portanto, estar sempre no centro do nosso viver a fim de controlar – ou até, algumas vezes, frear – a vontade e a sensibilidade.

 Contudo, vai aqui uma pequena, mas significativa prova de que a sadia rivalidade – controlada pela razão – pode facilmente ser deixada de lado: com meses de antecedência, grupos de “torcedores” (sim entre aspas) planejam brigas violentíssimas contra os rivais. Estes, nessa ocasião, são transformados em inimigos mortais e as ruas, as rodovias, ou as estações de trens e metrôs, os terminais de ônibus ou os interiores desses veículos de transporte público se tornam ambientes de guerra. São as famosas “pistas”, na linguagem dos torcedores organizados, que podem acontecer de um encontro fortuito ou ser marcado pela internet ou rádio (nextel).

 Se a situação é mais ou menos essa, algumas perguntas se impõem: que fazem os dirigentes de torcidas ante os seus associados brigões: Estimulam? Punem com séria expulsão? Dizem, depois das tragédias – à moda do ex-presidente Lula –, que não sabiam de nada e tudo fica por isso mesmo?

 E as autoridades (especialmente o serviço da inteligência da Polícia e o Ministério Público) vasculham a internet ou interceptam, com ordem judicial, os rádios? Se não fazem, perguntamos a razão; se fazem, gostaríamos de conhecer os resultados obtidos.

 Esses são alguns questionamentos a serem levantados ante a declaração do jogador Neymar, às portas da “Copinha São Paulo”, uma vez que também ela não está isenta de encrencas. Encrencas que com um pouco de vigilância e de boa vontade diminuiriam muito ou sequer aconteceriam. Com a palavra e a com a ação quem de direito!

Texto de Vanderlei de Lima. Ele é filósofo e escreveu, em coautoria, o livro “O protagonismo das torcidas organizadas na promoção da paz”.

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Comentários:

Excelente a abordagem realizada pelo amigo e escritor Vanderlei de Lima, presidente da TOPPAZ.

Conforme já venho ventilando nesse espaço em vários posts que possuem pertinência com o texto acima apresentado, falta transparência do Poder Público com relação as ações e aos resultados obtidos na luta contra a violência no esporte, sobretudo, entre torcedores.

A par disso, só recebemos notícias e dados estatísticos confirmando um aumento considerável da violência no seio das torcidas organizadas, atingindo níveis quase que similares aos existentes no país vizinho, a Argentina. 

Nesse diapasão para maior aprofundamento acadêmico, sugiro acessar os seguintes sites:

http://www.lancenet.com.br/minuto/Especial-Faccoes-mataram-pessoas-Brasil_0_674932706.html;
http://infosurhoy.com/cocoon/saii/xhtml/pt/features/saii/features/main/2012/10/25/feature-01).

Derradeiramente, a partir das palavras de um ícone do futebol brasileiro, como é o craque Neymar, novamente se reaviva a esperança do retorno da paz e de uma sadia rivalidade entre torcedores, para, paulatinamente, mudarmos o triste cenário de mortes e de uma quase que completa ausência cultural de convivência amistosa entre pessoas que somente vestem camisas e cores de diferentes agremiações desportivas.

Abraços e um ótimo ano de 2013 para todos!

FELIPE TOBAR